* Valéria Borborema
Como lidar com o isolamento social em tempos de pandemia de Coronavírus?
É preciso ao recluso lidar com os lutos advindos de uma situação nova, desconhecida.
Segundo Freud, o luto decorre de uma perda, seja de um ente querido ou mesmo de um ideal. O mundo torna-se cinzento, descolorido. Daí a necessidade de um tempo determinado para melhor apreensão da realidade. O que há de favorecer o redirecionamento da pulsão para outro objeto que não o que já não mais está aqui.
Para Lacan, o luto implica na devolução da castração (falta) ao sujeito, que deixa a condição de eromenos (amante) para assumir a condição de erastes (a quem a falta se faz presente). Daí o amor não ser outra coisa senão dar o que não se tem, ou seja, a própria falta. Com o luto, essa falta é-lhe devolvida.
Então! A perda abrupta da liberdade de ir e vir, por meio do isolamento imposto, precisa receber atenção privilegiada, não acha?
Por quê?
Bem! Se o luto não for experienciado, de alguma maneira ele retorna, mais dia, menos dia, quem sabe até na configuração de um trauma. Para Lacan, o trauma é sempre o encontro com o real (campo pulsional) da morte, do sexo ou do desamparo. Com algo irredutível à palavra.
A melhor maneira de lidar com o luto varia conforme o sujeito, a quem cabe descobrir elaborações significantes próprias, capazes de extraí-lo da concha do narcisismo para enfrentar melhor as vicissitudes da vida. A pulsão flui do Eu para o exterior.
Exemplo desses recursos inerentes ao próprio sujeito? Além de vivenciar a perda, criar ambiente favorável para o fluxo pulsional, usufruir de alternativas como atividade física, leitura, pintura, cinema, escrita, tudo, convém lembrar, de acordo com o desejo de cada um.
Afinal, é no advir das contingências que o sujeito emerge na criatividade, na invenção, no nomear o que o acomete.
A verdade, no entender de Lacan, tem sempre estrutura de ficção.
Bom isolamento social!
* Psicóloga Clínica